domingo, 9 de março de 2008

quinta-feira, 6 de março de 2008

SERTÃO MUNDO

Minha cidade
É o sertão
Que não tem portas nem janelas
O sertão é o mundo
A vastidão de terra seca
De cactos e gravatás
O sertão é a minha morada
Casa da cobra coral e da sucuriú
Onde
O vôo de um gavião
Confunde-se
Com o canto das cigarras
O sertão é o mundo
De canoas e canoeiros
De beatos e vaqueiros
De profetas e jagunços
Onde
O vôo do carcará
Confunde-se
Com o sibilar da cascavel
Minha cidade
É o sertão
Que não tem entradas nem bandeiras
Apenas o bafejo quente do vento
Acariciando
O corpo magro dos mandacarus
Enquanto
Um bando de ariris
faz acrobacias no céu

MINHA ALDEIA

Minha aldeia é simples
Como um presépio de natal
Tem um rio
Algumas canoas cobertas
De limo lodo lama
Peixinhos cor de sangue fazem festa
Em rebôjos e peraus
Há quintais
Com pés de pitanga e jenipapo
Lavadeiras
Pescadores
Canoeiros
E uma praia de areia branca ao longo dos olhos
Aqui
O horizonte é um infinito
Revoar de garças e andorinhas
Meu mundo é simples
Simples
Como um adro de igreja
Como um presépio de natal

MARACATU PARA YEMANJÁ

Negra rainha do Benin
Princesa do Ayucá

Negro barco
Negro oceano

Negra rainha
Do mar

Mãe
Dos peixes
Mãe
Da lua

Mãe
Dos
Tambores em festa

CANDOMBLÉ

Rodopia catimbó calunga
Oxumaré príncipe do arco-íris
Oxalá deus do céu e da terra
Corre savanas d`Àfrica
Senegal Nigéria Serra Leoa Costa do Marfim

Semente de obi
Batuque de obá
Rumpi rebentando
Tambores de Kêto
Axé de orixá mulher de Xangô
Mãos de Mãe Stela de Oxóssi
Sobre o peji de Yansã

FOTOGRAFIA ANTIGA

Não segui os conselhos de Drummond
Faço versos sobre acontecimentos
Que só interessam a mim

Principalmente faço versos
Para a minha cidade

E minha cidade continua sendo
Uma fotografia antiga pendurada na parede

Minhas confissões
Nada revelam

Acontecimentos extremos
A muito não acontecem

Permaneço impávido
Engolindo e vomitando outras paisagens

Fazendo versos
Como quem ri

quarta-feira, 5 de março de 2008

A NOITE DOS TAMBORES SILENCIOSOS

A noite
Caiu
Como um facho
De
Luz negra
Sobre a terra

No porto
Uma nau também negra
Cheia de almas negras
Esperava
O momento de partir pelo negro mar de espumas

Levando
Colares e contas
Lendas e mitos
Miçangas e patuás
Tambores e lágrimas
Suor e sangue escravo

ANCESTRAIS

Meus antepassados vieram da Mumbuca
Os pés negros sobre o pó das estradas
As mãos negras traziam farinha e beijus

Ainda hoje sinto em mim
Os pés sujos de poeira
E o rosto coberto de suor dos meus ancestrais

ULISSES DE ITINGA

Sob
O
Sol de Itinga
Ulisses
Amassa o barro da vida

O que povoa
Os sonhos
Deste homem simples

Que agora
às margens do rio
De sua infância

Cria e recria
Com mãos de anjo
O cotidiano do homem do vale

MESTRE ANTÔNIO

Mestre Antônio
Sorriso largo e baqueta nas mãos
Bate o tambor de mina
Batuca o atabaque
Com que dança
Na festa do rosário dos homens pretos de Minas Novas

MARIA LIRA

Na forma
E
Essência
Que
Maria Lira
Imprime ao barro

A Àfrica negra
Grita
De
Dor e desespero

Enquanto
Um índio
Cai
Por terra

Derramando
Sangue e lágrimas

ZEFA

No entalhe
E
Desentalhe
Da
Madeira
Zefa
Desfia
O cedro o jacarandá a imburana
Como
Num
Passe de mágica
Surgem
Santos vaqueiros canoeiros retirantes
Tudo de madeira
Mas como parecem gente

DONA ISABEL

Como Midas
Que
Transforma
Tudo o que toca em ouro

Dona Isabel
Reinventa com as mãos
A arte do barro

O milagre está feito
A sombra de Deus
Está presente nesse milagre

ASA DA PALAVRA

Meu povo tem fome de comida e livros
Não existe solidão para quem lê

Um livro pode conter
Rios montanhas alegrias esperanças ruas cidades países

A liberdade
Mora na asa da palavra